Uma história da cultura afro-brasileira
Walter Fraga e Wlamyra R. de Albuquerque
Editora Moderna
O excerto a seguir pertence à obra Uma história da cultura afro-brasileira, escrita pelos historiadores Walter Fraga e Wlamyra R. de. Albuquerque.
Abolição e a luta pela cidadania
Passada a festa, os ex-escravos procuraram distanciar-se do passado de escravidão negando-se a se comportar como os antigos cativos. Em diversos engenhos do Nordeste, negaram-se a receber a ração diária e a trabalhar sem remuneração. Muitos ex-escravos permaneceram nas localidades em que haviam nascido. Estima-se que mais de 60% deles viviam nas fazendas cafeeiras e canavieiras do Centro-Sul do Brasil. Mas decidir ficar não significou concordar em se submeter às mesmas condições de trabalho do regime anterior. Muitas vezes, os ex-escravos tentaram negociar as condições para sua permanência nas fazendas. No entanto, negociar com os libertos parece ter sido uma situação para a qual seus ex-senhores de mostraram indispostos.
Grande parte dessa indisposição para negociar estava relacionada aos desejos dos ex-escravos de terem acesso à terra e de não serem mais tratados como cativos. Na região açucareira do Recôncavo, os libertos reivindicaram a diminuição das horas de trabalho e dos dias que deveriam dedicar à grande lavoura de cana. Exigiram também o direito de continuar a ocupar as antigas roças e dispor livremente do produto de suas plantações. Nos dias imediatos ao 13 de maio, ocuparam terras devolutas de engenhos abandonados e iniciaram o cultivo de mandioca e a criação de animais. Isso mostra sua percepção de que a condição de liberdade só seria possível se pudessem garantir a própria subsistência e definir quando, como e onde deveriam trabalhar.
Para os ex-escravos e para as demais camadas da população negra, a abolição não representou apenas o fim do cativeiro, mas deveria ter como consequência também a liberdade religiosa de circular livremente sem ser importunado pela polícia, o acesso à terra, à educação e aos mesmos direitos de cidadania que gozava a população branca. Foi por isso que em uma correspondência endereçada a Rui Barbosa, libertos da região de Vassouras, no Rio de Janeiro, reivindicaram para seus filhos acesso à educação. Para eles, uma das formas de inclusão dos negros na sociedade de homens livres seria por meio da “instrução pública”, como se dizia então. Não sabemos se a carta teve resposta, mas é sabido que nenhum plano educacional foi elaborado para inclusão social dos filhos dos ex-escravos. [...]
FRAGA, Walter; ALBUQUERQUE, Wlamyra R. de. Uma história da cultura afro-brasileira. São Paulo: Moderna, 2009. p. 79-81.Habilidade da BNCC
9º ano
(EF09HI03) Identificar os mecanismos de inserção dos negros na sociedade brasileira pós-abolição e avaliar os seus resultados.