ALFREDO BOULOS JÚNIOR

O Grande Mar: uma história humana do Mediterrâneo

David Abulafia
Editora Objetiva

O excerto a seguir faz parte do livro O Grande Mar: uma história humana do Mediterrâneo, do historiador David Abulafia.

História do Mediterrâneo

“História do Mediterrâneo” pode significar muitas coisas. Este livro é uma história do Mar Mediterrâneo, mais do que uma história das terras em torno dele; mais particularmente, é uma história das pessoas que atravessaram o mar e viveram perto de suas praias, em portos e ilhas. Meu tema é o processo pelo qual o Mediterrâneo tornou-se, em graus variáveis, integrado numa única zona comercial, cultural e até, (sob os romanos) política, e como esses períodos de integração terminaram às vezes em uma violenta desintegração, devido tanto a guerras como pandemias. Identifiquei cinco períodos distintos: um Primeiro Mediterrâneo, que mergulhou no caos após 1200 a.C., ou seja, mais ou menos na época em que se acredita que aconteceu a queda de Troia; um Segundo Mediterrâneo, que sobreviveu até cerca de 500 d.C., um Terceiro Mediterrâneo, que emergiu lentamente e depois vivenciou uma grande crise na época da Peste Negra (1347); um Quarto Mediterrâneo, que teve de lidar com a competição cada vez maior do Atlântico e a dominação de potências atlânticas, terminando mais ou menos na época em que o canal de Suez foi aberto, em 1869; finalmente, um Quinto Mediterrâneo, que se tornou um corredor para o oceano Índico e encontrou uma surpreendente nova identidade na segunda metade do século XX.

Meu “Mediterrâneo” é decididamente a própria superfície do mar, seus litorais e ilhas, em particular as cidades portuárias que forneceram os principais pontos de partida e de chegada para os que o atravessaram. [...] A região interior — os eventos que ali aconteceram, os produtos originários de lá ou que passaram por lá — não pode, é claro, ser ignorada, mas este livro se concentra naqueles que molharam os pés na água salgada e, melhor ainda, empreenderam jornadas através dela, participando de forma direta, em alguns casos, do comércio intercultural, do movimento de ideias religiosas e de outros tipos ou, de forma não menos significativa, de conflitos navais pelo domínio das rotas oceânicas. [...]

Minha intenção foi descrever as pessoas, processos e eventos que transformaram todo ou grande parte do Mediterrâneo, mais do que escrever uma série de micro-histórias de suas margens. Por mais interessante que isso pudesse ser [...].

O Mediterrâneo tal como o conhecemos hoje foi moldado por fenícios, gregos e etruscos na antiguidade, por genoveses, venezianos e catalães na Idade Média, por armadas holandesas, inglesas e russas nos séculos anteriores a 1800; de fato há alguma força no argumento de que após 1500, e certamente após 1850, o Mediterrâneo se tornou cada vez menos importantes nos negócios e no comércio mundiais mais amplos. Na maioria dos capítulos, concentrei-me em um ou dois lugares que acredito que expliquem melhor os acontecimentos mais gerais no Mediterrâneo – Troia, Corinto, Alexandria, Amalfi, Salônica e assim por diante –, mas a ênfase é sempre em suas ligações através do mar Mediterrâneo e, quando possível em alguns dos povos que efetuaram ou vivenciaram essas interações. Um resultado dessa abordagem é que falo menos sobre peixes e pescadores do que alguns leitores poderiam esperar. A maioria dos peixes passa a vida sob a superfície da água e os pescadores tendem a deixar um porto, apanhar sua presa (em geral a alguma distância do porto de origem) e voltar para a base. De um modo geral, eles não têm um destino do outro lado do mar onde farão contato com outros povos e culturas.

ABULAFIA, David. O Grande Mar: uma história humana do Mediterrâneo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2014. p. 17-19.

Habilidade da BNCC

6º ano
(EF06HI15) Descrever as dinâmicas de circulação de pessoas, produtos e culturas no Mediterrâneo e seu significado.