ALFREDO BOULOS JÚNIOR

Os índios na História do Brasil no século XIX: da invisibilidade ao protagonismo

Maria Regina Celestino de Almeida https://rhhj.anpuh.org/RHHJ/article/download/39/29

No artigo Os índios na História do Brasil no século XIX: da invisibilidade ao protagonismo, a historiadora Maria Regina Celestino de Almeida expõe como a historiografia recente passou a identificar o protagonismo de um grupo social que antes não era visto como sujeito histórico. No trecho destacado, ela aborda as tentativas de criação de uma representação única para povos tão diversos.

Os índios na História do Brasil no século XIX: da invisibilidade ao protagonismo

Embora menos estudada, a presença e a atuação indígena na história do século XIX vem se tornando cada vez mais visível em pesquisas sobre diferentes temas. Dentre eles, ressalto a política indigenista do Império; as disputas por terras nas antigas aldeias coloniais; os discursos de desaparecimento dos índios; as guerras ofensivas contra os povos considerados selvagens, com destaque para os botocudos e os kaingangs; o indianismo brasileiro e as construções de imagens dos índios na literatura, nas artes e nos discursos de políticos, intelectuais e viajantes; o lugar dos índios na historiografia do século XIX [...].

A enorme diversidade de populações indígenas no território brasileiro dificultava não só a aplicação de uma política de caráter geral, como também a construção de uma única imagem de índio condizente com os ideais da nova nação. Do ponto de vista político, pregava-se o assimilacionismo, com procedimentos diversos, como já vinha ocorrendo desde o período pombalino. Do ponto de vista ideológico, discutia-se a possibilidade de tornar o índio símbolo nacional. O desafio era grande e as divergências, muitas. Afinal, os índios ocupavam terras, ameaçavam colonos, recusavam-se ao trabalho e lutavam para conservar suas aldeias. Como transformá-los em símbolo nacional se eram considerados inferiores e ameaças ao desenvolvimento e progresso econômico [...]? Certamente, esses índios não serviam para simbolizar a nação, nem tampouco para compor o projeto de construção da memória e história coletivas do novo Estado. Foi a imagem idealizada do índio que permitiu, no plano ideológico, transformá-lo em símbolo nacional. Essa imagem pouco teria a ver com os reais habitantes dos sertões e das aldeias do Império. Discursos e obras políticas, literárias, históricas, científicas e artísticas desse período caracterizaram-se pela idealização dos índios do passado, enquanto ignoravam ou demonizavam os grupos ou indivíduos indígenas ainda muito presentes no território brasileiro. Estes últimos, bastante vivos e atuantes no século XIX, eram presença constante nos artigos das revistas do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), nos Relatórios dos Presidentes de Província, na correspondência entre autoridades diversas e nas discussões da Assembleia Legislativa e das Câmaras Municipais. Essa documentação não deixa dúvidas sobre a atuação desses povos ao longo do século XIX, atuação essa que, como em períodos anteriores, influenciava os rumos das políticas para eles traçadas. Discutia-se essencialmente se os índios deviam ser integrados de forma pacífica ou violenta. As concepções políticas e ideológicas sobre os índios se associavam e eram fundamentalmente influenciadas pelas realidades econômico-sociais do novo Estado. Como destacou David Treece, as representações romantizadas do índio que apareceram de diferentes formas na literatura, na música e na pintura não estavam descoladas da realidade política e social do período. Eram, sem dúvida, construções idealizadas, porém estavam ancoradas nos contextos históricos em que foram elaboradas. Os intelectuais e artistas por elas responsáveis não viviam, absolutamente, alheios às discussões políticas e sociais sobre os índios. Na maioria das vezes, envolviam-se nelas diretamente pelas funções políticas exercidas e quando não o faziam, suas obras, de um modo geral, influenciavam e eram influenciadas pelas realidades que vivenciavam. Os intelectuais responsáveis pela construção das imagens sobre os índios, bem como os viajantes, cujas descrições contribuíam para reforçá-las, comungavam, grosso modo, com as ideias de assimilar os índios e transformá-los em eficientes cidadãos do novo Império. Seus discursos e representações eram coerentes com a política indigenista do século XIX. [...]

ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Os índios na História do Brasil no século XIX: da invisibilidade ao protagonismo. Revista História Hoje, v. 1, n. 2, p. 24, 27-29, 2012. Disponível em: https://rhhj.anpuh.org/RHHJ/article/download/39/29. Acesso em: 25 jul. 2019.

Habilidade da BNCC

8º ano
(EF08HI27) Identificar as tensões e os significados dos discursos civilizatórios, avaliando seus impactos negativos para os povos indígenas originários e as populações negras nas Américas.