ALFREDO BOULOS JÚNIOR

A mulher na Idade Média

José Rivair Macedo
Editora Contexto

O trecho a seguir foi escrito por José Rivair Macedo e pertence à obra A mulher na Idade Média.

Uma poetisa atuante: Cristina de Pisan

A mais célebre poetisa medieval viveu dois séculos depois das [trovadoras]. Era italiana de origem, mas francesa por adoção. Nasceu em 1364 na cidade de Veneza. O pai, Thomaz Pisan, era astrônomo famoso e como tal foi convidado a participar da corte refinada de Carlos V, o rei sábio. Nessa corte, Cristina viveu boa parte da infância. Nas bibliotecas do rei colheu os primeiros frutos do saber. Aos quinze anos, como era costumeiro então, o pai destinou-lhe um marido, um cavaleiro da corte chamado Estêvão Castel, notário e secretário do rei.

O casamento durou dez anos. Três filhos nasceram. [...] Uma reviravolta no destino de Cristina aconteceu no dia 7 de novembro de 1389. Estêvão morreu, atacado por violenta febre, comum naquela época de inúmeros surtos de epidemias. Como muitas mulheres ela ficou só, viúva aos vinte e cinco anos, com três crianças para criar e educar, com a casa para manter e dívidas para quitar. Pouco depois, para agravar ainda mais sua situação o pai faleceu. Ela perdeu até mesmo a proteção real que gozava até então. Teve início uma fase difícil.

Obrigava a tomar a dianteira no governo da família, foi, como tantas outras viúvas, vítima de injustiças. Nem mesmo certos direitos devidos ao marido lhe foram pagos. Foi obrigada, em 1390, a mover um processo contra o tribunal de contas do reino. Treze anos depois teve ganho de causa. Mas precisou esperar até 1411 para receber a soma devida. Morto subitamente, o marido não teve tempo para informá-la dos seus negócios. Despreparada, a jovem viúva tornou-se presa fácil para vigaristas de toda espécie. Era assediada, de um lado, por credores vorazes. De outro, topava com a resistência dos devedores relapsos. Para sobreviver teve de transformar seu saber em profissão. Educada, culta, conhecedora do mundo das letras, fez das palavras seu ganha-pão, da poesia o seu sustento.

Tornou-se brilhante poetisa. Compôs inúmeras baladas na mais pura tradição da lírica cortês, formando uma obra poética que a igualou aos principais poetas do tempo. Abordou todos os temas que o amor pode inspirar. Deu preferência, contudo, às sensações provocadas pela ausência do amado: a inquietude, o desespero, o amargor. Muito da sua existência ela transferiu para os versos:

Tenho a impressão que há cem anos
meu amigo me deixou
Faz quinze dias que partiu:
me parece que fez cem anos.
Assim, o tempo me aborrece
Porque, desde que ele se foi
me parece que faz cem anos.
MACEDO, José Rivair. A mulher na Idade Média. São Paulo: Contexto, 1990. p. 82-83.

Habilidade da BNCC

6ª ano
(EF06HI19) Descrever e analisar os diferentes papéis sociais das mulheres no mundo antigo e nas sociedades medievais.